QUANDO SE DEGLUTEM MAIORES QUANTIDADES DE AR DO QUE AS TOLERADAS PELO ORGANISMO E ESTAS FICAM ACUMULADAS NO APARELHO DIGESTIVO, PRODUZ-SE A CHAMADA AEROFAGIA. ESTA, POR SUA VEZ, PODE DAR LUGAR A OUTRA PERTURBAÇÃO, DESIGNADA POR FLATULÊNCIA.
O gás é um dos muitos componentes que é possível encontrar, embora não em grandes quantidades, no aparelho digestivo do ser humano. Por outro lado, apesar da sua função não estar definida de modo claro, parece que participa no processo digestivo dos alimentos. Pode comprovar-se que, em condições normais, uma pessoa acumula no seu tubo digestivo, em média, cerca de 150 mililitros de gás. Destes, cerca de 70% provém do ar deglutido; 20% do gás está contido no sangue, enquanto que os restantes 10% associam-se a processos de digestão intestinal.
A composição dos gases contidos no organismo pode variar em função da procedência descrita. Deste modo, por exemplo, sabe-se que o gás acumulado no estômago possui, praticamente, os mesmos elementos do ar atmosférico, como o oxigénio, o anidrido carbónico e o nitrogénio; enquanto que, no intestino e no cólon, além do nitrogénio, pode encontrar-se hidrogénio e metano, produzidos pela fermentação dos alimentos, assim como pela ação das bactérias intestinais.
Porém, o organismo não se limita a acumular estas substâncias gasosas: algumas, aquelas que não apresentam utilidade, são repelidas por ele. O anidrido carbónico é o gás que mais rapidamente se expulsa, sobretudo pelo aparelho respiratório, enquanto que o oxigénio pode ser absorvido pelo sangue e pelos tecidos e não é raro encontrar metano nas fezes excretadas. Estas são as vias normais através das quais os gases se libertam do organismo, embora não sejam as únicas.
Quando se deglutem maiores quantidades de ar do que as toleradas pelo organismo e estas ficam acumuladas no aparelho digestivo, produz-se uma perturbação conhecida pela denominação de aerofagia, que significa, literalmente, "engolir ou comer ar". Uma das práticas mais habituais para obter alívio deste incómodo é o popular arroto – mais corretamente, eructação –, através do qual se liberta – pelas vias aéreas e boca – uma parte da quantidade de gás retida.
Se não for controlada, a aerofagia pode transformar-se numa má conduta social, já que a pessoa arrota continuamente para se sentir aliviada, até que se vê encurralada num ciclo vicioso, quando esta perturbação adquire um caráter crónico.
Chega-se à aerofagia crónica se não se evitam os principais fatores desencadeantes, entre os quais se encontram o hábito de comer muito depressa e mastigar indevidamente, a ansiedade ou alguma perturbação que impede respirar adequadamente pelo nariz e obriga a fazê-lo pela boca, com o que será maior a quantidade de ar que passa diretamente para o aparelho digestivo.
Os maus hábitos alimentares provocam inchaço e distensão em todas as zonas do aparelho digestivo. Sucede no estômago algo parecido com o que se passa quando se introduz ar num balão: este distende-se para poder adaptar-se à quantidade de gás armazenado. Devido a esse processo de inchaço, ao qual não estão habituadas as paredes do estômago, produzem-se os incómodos típicos da aerofagia, e como estas paredes têm terminações nervosas, enviam constantemente sinais ao sistema nervoso central.
Contudo, nem todo o ar engolido fica retido no estômago, já que uma certa quantidade passa para o intestino; aí une-se a outro tipo de gases, produzidos pela decomposição dos alimentos, sendo todos eliminados para o exterior através do reto.
Quando estes gases não conseguem expulsar-se com normalidade ou são produzidos em excesso, devido a uma série de fatores, como o crescimento excessivo da flora intestinal ou o mau funcionamento motor do intestino, produz-se o que se denomina por flatulência intestinal.
As perturbações mais frequentes produzidas pela flatulência são a distensão, os ruídos intestinais e a expulsão contínua de ar por via anal, a qual começa, aproximadamente, uma hora após se ter comido. A dor que, por vezes, se sente depende de dois fatores principais: da concentração dos gases e da rapidez com que se produz a distensão.
Embora, à primeira vista, não exista qualquer relação entre perturbações tão díspares como as alterações psíquicas e os gases, o certo é que existe um vínculo importante entre ambas. Com efeito, existe um grande número de pessoas com este último tipo de perturbações, que revelam também sinais de sofrerem de stress, ansiedade, neurose, depressão ou alguma outra patologia psíquica. Nestes casos, a quantidade de gás contida no organismo dessas pessoas pode triplicar.
A origem desta relação, segundo os especialistas, reside no facto de quando alguém sofre de ansiedade, por exemplo, engole mais ar do que o normal; isto é, o processo de deglutição exagera-se, quer inconscientemente quer por um tique quer ainda devido a uma hipersalivação, enquanto o referido excesso de gás vai parar, em princípio, ao estômago, o qual, não podendo absorvê-lo todo, liberta-se do excedente mediante arrotos ou flatos.
Como se pode ver, as perturbações emocionais representam uma importante causa de acumulação de gases. Isto explica que os tratamentos para atacar o problema incluam o abandono de determinados hábitos da vida quotidiana e a aquisição de outros mais sãos. Evitar as tensões diárias, sobretudo na hora da refeição, desfrutar mais do tempo de lazer e fomentar o exercício físico são algumas destas medidas.
Em determinados casos, há que recorrer aos ansiolíticos ligeiros e, se necessário, submeter-se a psicoterapia, até conseguir controlar o problema. Também é necessário aprender a comer de forma mais lenta, mastigando bem os alimentos e engolindo-os sem pressas.
Quando a acumulação de gases é produzida por outros motivos, os tratamentos diferem: se é devida à obstipação, pode receitar-se um laxante fisiológico; outros fármacos aos quais se recorre são os antiespumantes, cuja função não consiste tanto em evitar que se acumule o gás, mas antes em ajudar a que se dissolva. A maior parte destes medicamentos, cujo objetivo básico é ajudar o intestino na tarefa de absorver o gás, inclui uma pequena quantidade de ansiolítico ou relaxante, dada a importância destes na resolução do problema.
De qualquer forma, ao constituir a retenção de gases uma verdadeira patologia, o mais importante é seguir as normas e os conselhos sugeridos, quer pelo especialista quer pelo clínico geral. Se a pessoa afetada conseguir mudar certos hábitos higiénicos e dietéticos, conseguirá, por certo, obter ótimos resultados.
É conveniente insistir no capítulo dos hábitos dietéticos e, em particular, na influência da inclusão de determinados produtos na dieta habitual. Com efeito, há uma série de alimentos que, ao produzirem diversos gases no momento de se decomporem no intestino, são causa de flatulência. Entre eles, encontram-se os legumes, algumas hortaliças e os produtos lácteos. Além disso, há que ter especial cuidado com os produtos elaborados com levedura, como as massas, o pão, os bolos, etc.
Os especialistas também desaconselham as comidas que contêm grandes quantidades de fécula ou de fibras de celulose, porque podem dar lugar à acumulação no intestino de gases do tipo do anidrido carbónico, com as consequentes dificuldades que surgem no momento de libertá-los.
Muitos destes alimentos são perfeitamente substituíveis por outros menos flatulentos, sem que por isso a dieta sofra um empobrecimento. Por exemplo, certas hortaliças tão flatulentas como o repolho, as couves-de-bruxelas ou a couve-flor podem ser substituídas por outros vegetais, como os espargos, as alcachofras e os espinafres.
Por conseguinte, a receita está dada: menos stress, mais cuidado ao comer e uma alimentação mais saudável.